quinta-feira, 29 de julho de 2010

Cartomância de feira



Medusa desconfia brutalmente das ciências ocultas. Todas. Idolatrias.

Entrou na tenda muito contrariada. Achou a decoração pirosa. O incenso nauseou-a.
Via-se mal. Sentou-se. Esperou. Até que lhe chegaram os olhos amendoados cor de esmeralda. Madura; gorda; mal arranjada. Medusa vaticinou: menopausa.

A mulher lá fez o que tinha a fazer enquanto Medusa contorceu-se de desconforto. Sem um único movimento. Mais de uma hora nisto.
No fim, Medusa exausta, mulher satisfeita – cheia do gozo, certa de que a tinha esmagado.

Ditou-lhe:

“Comporta-se de forma polida e controlada. Por vezes usa uma linguagem rebuscada, pouco comum num contexto coloquial. É uma pessoa popular entre pares. No entanto, as suas relações são marcadas pela superficialidade. É-lhe difícil o contacto humano em profundidade e, portanto, a identificação com os outros. Parece faltar-lhe capacidade empática. Defende-se. Não apresenta traços marcados de hostilidade ou agressividade mas tem uma grande tendência para o controlo. Facilmente inverte papéis, procurando impor-se e afirmar o seu ponto de vista. Esta atitude de cariz narcísico arrisca a fazê-la perder a objectividade.

Felicidades, Madame X.”

Medusa saiu da tenda com um sorriso rasgado no rosto e os olhos a brilhar de fogo.
Estava intacta.

5 comentários:

  1. Essa Madame está é a precisar de uns xanax e lexotans em dose de cavalo, e já agora uma chave de fendas para lhe apertar um outro parafuso mais solto.
    LY, C.

    O homem faz-se ou desfaz-se a si mesmo. O homem controla as suas paixões, as suas emoções, o seu futuro. Consegue-o canalizando os seus impulsos físicos para conseguir realizações espirituais. Qualquer animal pode esbanjar a sua força realizando os impulsos físicos sempre que os sente. Compete ao homem canalizá-los para fins mais produtivos que a satisfação dos impulsos. Ninguém se tornou ilustre por fazer o que lhe apetecia. Os homens insignificantes fazem o que querem - e tornam-se nuns Zés-Ninguém. Os grandes submetem-se às leis que regem o sector em que são grandes.
    O autodomínio é sempre recompensado com uma força que dá uma alegria interior inexprimível e silenciosa que se torna no tom dominante da vida. O autodomínio é a qualidade que distingue os mais aptos para sobreviverem. O mais importante atributo do homem como ser moral é a faculdade de autodomínio escreveu Herbert Spencer. Nunca houve, nem pode haver, uma vida boa sem autodomínio; sem ele a vida é inconcebível. A vitória mais importante e mais nobre do homem é a conquista de si mesmo.

    Alfred Montapert, in 'A Suprema Filosofia do Homem'

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  2. C., esse Alfredo deita cartas em que feira?

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  3. Realmente, só tu conseguirias transfornar esta zandinguisse num post maravilhoso. Lá está! A perfeita analogia de Versailles...

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  4. O que é que essa senhora diria se soubesse que tenho problemas em tocar nas pessoas?

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