domingo, 18 de setembro de 2011

Desenganem-se os que pensavam que se tinham livrado daquela mania do domingo como dia de elevação espiritual

P

Mas muita coisa acontece ainda antes que o andamento termine. Porém, quando finda e no decorrer do seu final, depois de tanta raiva, tanta pertinácia, tanta obstinação, tanta extravagância, sobrevém algo que, na sua brandura e bondade, é totalmente inesperado e comovente. O motivo que, curtido por inúmeras vicissitudes se despede, e, ao fazê-lo, se converte inteiramente em despedida, grito e aceno de adeus, sofre, no seu ré-sol-sol, uma leve modificação. (…)

É como uma carícia dolorosamente amorosa, que passa pelos cabelos, pela face; um olhar inquieto, intenso, que se aprofunda nos olhos do outro, pela última vez. Abençoa o objecto, a fórmula terrivelmente atormentada, conferindo-lhe irresistível humanidade e confiando-a ao coração do ouvinte num adeus, num eterno adeus, pronunciado com tamanha doçura que os olhos se lhe enchem de lágrimas. “Deixa - de sofrer!” diz ele, “Deus ajudou – nos”, “Belo sonho foi”, “Ama-me sempre”. Assim termina. Rápidos e duros tercilhos correm em direcção a uma conclusão qualquer, pela qual muita outra peça também se poderia acabar.

Thomas Mann, sobre Opus 111, in Doutor Fausto, Edit. D. Quixote.

p.s. Para almas mais impacientes: a partir do minuto 6.

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